Existe um ponto de convergência no cérebro humano que é necessário entender. O ser humano guia-se, motivacionalmente, por dois grandes padrões: a Recompensa e o Evitamento da perda.
Neste sentido é necessário preparar uma cidade para estimular estas áreas neurobiológicas, que por motivos de extensividade iremos apenas salientar algumas zonas. Inspirado por uma visita por Itália, fui percebendo que o Marketing das cidades não é novo, o que aconteceu é que perdemos capacidades para o entender como tal… Ora vejamos como estimular estruturas, ilustrado com exemplos da antiguidade clássica.
Córtex Orbitofrontal – Esta área associada à recompensa é fortemente estimulada por dopamina. Para aumentar a dopamina no organismo dos utilizadores de uma cidade, pode-se seguir o exemplo dos artistas do renascimento. Grandes estátuas surgem onde e quando menos se espera, monumentos grandiosos alimentam a surpresa que deve ser constante. Além da surpresa a recompensa, e veja-se o que se fazia na antiga Roma… Espectáculos de gladiadores, lutas com feras exóticas… Enfim é o show “Grátis” para o utilizador da cidade. As festas eram sem dúvida alguma uma forma de aumentar a confiança dos utilizadores, onde eram organizados grandes bailes em que a música clássica era constante proporcionadora de prazer e de exclusividade… Não era o tudo para todos, mas tornava cada utilizador da cidade especial.
Núcleo Accumbens – Por falar em prazer, esta é a estrutura do prazer por excelência. Na antiguidade, por exemplo em Florença, existe um apelo à sexualidade e ao perfeccionismo estético, ilustrados por imensas esculturas perdidas pela cidade, como por exemplo o David de Miguel Angelo e a Judite e Holofernes de Donatello que ilustram a majestosa entrada do Palazzo Vecchio, agregado pela perfeição do corpo humano mostrando toda a sua volúpia na loggia dei Lanziestimulando o espanto pelo perfeccionismo, mas ao mesmo tempo excitação pelas representações de poder e sexualidade agregante. As pinturas, a música, a comida, o divertimento e a forma de vestir dos utilizadores das cidades são outro ponto alto na estimulação do prazer… Veja-se o sucesso dos carnavais (sejam de Veneza, do Rio de Janeiro ou de Barranquilla)… Todos com pontos comuns: o prazer é valido por um tempo determinado!
Hipocampo – O hipocampo é a área das memórias… Essencial estimular para receber turistas numa segunda viagem, para um marketing viral ou para uma simples recomendação. Mais uma vez os antigos eram exímios, ilustravam as suas cidades com decoração que ilustrava a religião (que do latim significa religar as pessoas em torno de algo), os deuses, as histórias de guerras e batalhas… se as religiões sao tão importantes e se promovemos a liberdade religiosa, porque não atrair as religiões para a cidade? Porque não incentivar à construção dos seus templos? A memória colectiva que tanto falava Jung! Neste campo importa trazer Kanehman à discussão, o laureado da Psicologia, que descobriu que os últimos momentos de uma memória, “indexam” a qualidade dessa mesma memória. Então deve a cidade preocupar-se com as despedidas. E como sabe isso? Com os hotéis… Proporcionar surpresas aos visitantes, como oferecer uma coroa em louro (como se fazia na antiga Roma), dizer um “até já” de forma original evocando as memórias colectivas, é outra forma de estimular esta zona indexando memórias.
Hipotálamo – Uma estrutura que se move para controlar as necessidades básicas do ser humano, a fome e a sede são controlados por criação de uma boa rede de restaurantes e bebedouros, como a Piazza Madonna dei Monti em Roma. A temperatura é outra questão fundamental que é controlada por esta zona. Assim criar sombras e espaços verdes para o Verão, com “bufadores” de água com aromas pode indexar uma cidade de forma muito forte. No frio e na chuva… Criar circuitos com cobertura para as zonas fundamentais… Ajuda os comerciantes e faz circular as pessoas com mais comodidade! Podem ser uma espécie de “verandas” que funcionam para chuva no Inverno e para sombra no Verão. O Hipotálamo também reage a estímulos “provocantes”. E porque não ilustrar a cidade com imagens gigantes (que podem cobrir edifícios velhos e devolutos) com provocações a quem passa? O desafio é algo que o nosso cérebro adora!
Córtex Pré-Frontal – O que mais precisa uma cidade do que uma oferta de ócio, lifestyle e qualidade de vida? Para onde ir quando não se sabe o que fazer? Uma cidade tem que responder a estas questões. Já os antigos aprendiam isto, os circuitos termais, como é o exemplo das termas de Diocleciano que tinham 13hectares e acolhiam 3000 pessoas, as piscinas publicas como as Termas de Trajano, a construção das cidades junto a água, são imperativos… Então a cidade deve preocupar-se em ter entretenimento com água, fontes imperiosas, lagos artificiais espalhados pela cidade como surpresas sumptuosas… Só Roma conta com mais de 2000 fontes construídas desde o séc. IV… Parques temáticos com piscinas podem resolver o assunto das que não têm praia e servem para o Inverno como as termas romanas. Um espaço interessante que visitei foram umas termas multisensoriais em Chianciano Terme, que oferecem além das termas normais, um espaço lúdico e de estimulação brutal. Não só a oferta de lojas, mas de espaços verdes com cultura ao ar livre… O turista moderno quer ver sem pagar e por isso a estética exterior da cidade é importante. Ser original… Aí está a questão! Criem labirintos urbanos, percursos temáticos que ocupam uma tarde para oferecer ao turista a possibilidade de não viver o acaso, mas recriar a surpresa. O posto de turismo não deve ser estático devem existir na rua, junto do utilizador da cidade que não é apenas o turista, mas também o residente que tem que ser evolvido no plano da sua cidade. Assim era com os romanos, assim o faz e fazia a Igreja, envolve os crentes na preparação dos estímulos.
A cidade deve ser intuitiva, deve oferecer as necessidades dos utilizadores e por isso a forma mais e económica de o fazer é criando pontos de recolha de opinião dos utilizadores. Assim sentem-se participantes. Os antigos criavam fóruns onde se debatia, onde se resolviam problemas com os cidadãos. Criar zonas de opinião publica podem resultar em melhorias para a cidade e ajudam ao sentimento de pertença.
E se o se humano tem aversão à perda, o que fazer para ele ganhar? Criar zonas que proporcionam negócios, atrair investidores que gerem emprego, sempre foi essa a estratégia das zonas de livre comércio. Portos, entrepostos, mercados, zonas industriais, mão-de-obra competitiva e segurança. Eis algumas preocupações que se devem ter e publicitar! E não são precisos muitos monumentos… Veja-se Pisa.. Só uma torre com uma catedral e veja-se a economia que gera a uma cidade? Crie-se um espaço grande e magnânimo que atraia pela sumptuosidade… Crie-se o primeiro motivo, venda-se o produto às agências e depois é deixar fruir a cidade!
Outra ajuda que a cidade pode dar aos seus comerciantes é a realizar um estudo de necessidades da cidade… Para quê abrir mais uma sapataria se o que faz falta é uma loja de malas? Este estudo de necessidades pode ajudar os investidores que feito de uma forma rigorosa pode garantir sustento para todos… Veja-se o controlo que se fazia com as farmácias que garantia sustentabilidade do negócio, garantindo que existissem em número e localização suficiente para o utilizador durante 24h. Sem restrições a cidade pode aconselhar… Com dados fiáveis e actualizados anualmente. Ajuda também a fazer um estudo de necessidades urbanas para uma correta utilização do investimento público. Serve também para atrair investidores de universidades, hotelaria, indústria, enfim… Com uma espécie de sensos da cidade anuais podemos ter um retorno incalculável.
Outra estratégia para o utilizador da cidade pensar que ganha é promover à criação de outlet’s. O mercado de rua deve ser pensado para animar a cidade e os pequenos outlet’s em bancas podem resolver essa situação. Assim o cliente sente que nunca perde na visita à cidade. As cidades devem ser conotadas com algo, por exemplo, em Aruba as jóias são baratas, em Miami os outlet’s são muito baratos e os turistas são aconselhados a ir de mala vazia para encher lá, enfim… São marcas das cidades!
E como abrir um casino não é fácil, apostar em recintos desportivos, de eventos musicais, enfim, eventos de massas que canalizem muitas pessoas para a cidade, aumenta o interesse do investidor. Uma ideia… Porque não criar uma cidade com o nome “premium low coast”, onde com um patrocínio de uma companhia aérea se fazia um pequeno aeroporto low coast e se criava uma cidade direccionada para preços Low Coast, mas com tudo o que uma grande cidade tem… Mas mais barata!
Existe uma outra questão a pensar numa cidade… A estimulação aos sentidos. Mas como estimular os sentidos numa cidade?
Visão – As cores devem ser uma preocupação constante. Deve existir uma coerência quer durante o dia com flores, pinturas de casas, cartazes… E de noite, com iluminação de edifícios (excelente exemplo o ministério da economia da Ciudad de México), das ruas, dos bares e até dos espaços públicos. Porque não mudar as cores da iluminação pública?
Olfacto – De facto esta pode parecer a mais difícil, mas com disperssores de “bufos” de água aromatizada, com a colocação do mesmo aroma em todos os edifícios públicos, com a plantação de ervas aromáticas que tenham o mesmo aroma, criando a cultura a este aroma incentivando as pastelarias, bares e restaurantes a produzirem produtos com este aroma, aromatizando o papel de todos os documentos oficiais, enfim… Desde que exista uma estratégia o aroma está em todo lado. E que melhor estimulo para evocar memórias que não o bulbo olfactivo que projeta à amígdala e ao hipocampo?
Paladar – Este pode ser sem dúvida o mais difícil. Mas quem não recorda os pratos típicos de algum local e associa esse local ao prato, como é o caso do Leitão da Bairrada ou das Tripas à moda do Porto. Aproveitar a gastronomia e mobilizar os agentes gastronómicos pode ser fundamental… Mas aqui tem que ser pensado o utilizador da cidade! Devem ser criados menus da cidade e não apenas um prato! Tudo deve girar em torno de um denominado comum, como acontece com as pizzas, a base e a ideia é a mesma, mas existe uma adaptação a todos os gostos.
Audição – E se existisse uma música da cidade? E uma rádio e TV da cidade? Seria até uma forma de suportar custos de algumas intervenções. Colocação de colunas em toda a cidade, por exemplo, no caso de não se pretender criar uma rádio, porque não tornar a cidade a cidade de uma rádio nacional? Nos parques deveria ser aumentado o barulho e prazer da natureza com sistemas sonoros. Deviam existir zonas de inspiração onde o tipo de música é diferente para diferentes públicos.
Propioceção – Sem dúvida alguma, um dos mais importantes. Os solos de circulação devem ser diferenciados… Mais macios nas zonas de compras e de circulação lenta e mais duros e sem buracos nas zonas de circulação rápida. Devem ser tidos em conta os buracos de drenagem para não existir água nas ruas, principalmente nas zonas cobertas, mas preocupando-se com o bem estar feminino de quem anda de salto alto. Criar solos sensoriais é muito útil para avisar os invisuais e para alertar os distraídos de perigos, mas o mais útil é que permitem ao utilizador da cidade o conforto e o agrado que muitas vezes serve uma simples alcatifa colorida nas ruas de mais interesse!
Termoceção – Como abordado acima devem ser criadas ruas de “temperatura controlada”… Colocando coberturas tipo Veranda (uma espécie de vidro/acrílico com flores por cima… Verdura que floresce na Primavera/Verão criando sombra e que perece a folhagem no Outono/Inverno fazendo passar o calor do Sol e impedindo a chuva) que um Arquiteto paisagista poderá pensar sem implicar grandes custos. Colocar cogumelos de aquecimento nas ruas pode ser caro, mas e se nestas ruas semi-cobertas se criarem esplanadas com aquecimento/arrefecimento obrigatório? Aumentaria a faturação dos cafés/bares/restaurantes, criava infra-estruturas para receber os utilizadores da cidade e ao mesmo tempo ajudaria a climatizar as ruas.
Tato – E onde toca o utilizador da cidade? As mesas, balcões, assentos de autocarro/metro/comboio, touch points na rua, enfim… A preocupação com a sensibilidade e rugosidade dos materiais deve ser uma constante. Utilizar tecidos da cidade, texturas oficiais, superfícies pensadas para o toque, aromatizadas, fará com que os pequenos pormenores se formem em pequenas experiências de prazer. Bolinhas de sabão aromatizadas em algumas ruas podem funcionar muito bem e o custo não é elevado! Porque não criar um cinema multisensorial a céu aberto?
Mas mais que os sentidos é a experiência… Pensar a cidade de forma estratégica é criar um plano de comunicação com atividades para 365 dias do ano por forma a surpreender o utilizador da cidade. Além das pequenas experiências devem existir experiências familiares aos Domingos… Todos os Domingos… E mensalmente deve existir uma grande atividade com captação de grandes públicos… É isso que vai indexar a cidade na sua regularidade. Anualmente devem ser realizados 4 grandes eventos pelo menos. Assim, pensar uma cidade como se pensa um negócio é possível, e com alguma estratégia até pode dar lucro que permite o seu reinvestimento na cidade aumentando as ligações desta ao cérebro do seu utilizador! Simples não?
Bem, também é verdade que não é assim tão simples, pois é necessário estudar primeiro os cérebros dos utilizadores, pensar na estratégia existente e adequar tudo isto com os recursos existentes, mas tudo isto é possível… Basta abrir os horizontes e começar a trabalhar para a criação de cidades cool, com utilizadores satisfeitos que recomendam e que participam fazendo parte do tecido neuronal e do ADN da cidade!