quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

O homem também chora




Mais do que chorar, a mulher não tem vergonha de o mostrar. E usa esta sua expressividade para descarregar raivas, frustrações e angústias. Também o faz quando não cabe em si de felicidade. Mas na sua discreta sabedoria, as mulheres sabem que podem também utilizar esta característica com um trunfo para conquistar a atenção de alguém, a compaixão dos outros e até levar a água ao seu moinho.

Um homem não chora?
Se pensa que as mulheres são mais choronas do que os homens, engana-se. Elas apenas o demonstram mais, sem se importar de esconder dos outros. Em segredo, e sozinhos, não sabemos se os homens não deitam mágoas cá para fora e não vão às lágrimas quando se sentem muito tristes ou quando o coração extravasa de felicidade. Cientificamente, nunca foi conduzido um estudo que levasse a essa conclusão. "Em termos empíricos há essa percepção, de que a mulher chora mais. Ou, pelo menos, chora de uma forma mais aberta, sem vergonha, nas situações em que se sente naturalmente predisposta para chorar. O homem não", justifica Ana Paula Nunes, psicóloga. O homem reserva-se o direito de chorar às escondidas, porque lhe foi dito que 'homem não chora'. "E ele não chora. Com todos os problemas que isso acarreta, no entanto, chorar é saudável", continua Ana Paula Nunes.
Tudo isto está profundamente ligado às diferenças entre o homem e a mulher. A mulher é educada a expressar sentimentos, o homem a ocultá-los. E isso reflete-se no comportamento dos dois sexos. "O choro faz parte do comportamento e este é perfeitamente controlado pelos fenômenos culturais e sociais. Não é porque as mulheres são mais sensíveis e os homens menos", explica.
Se não há estudos que possam concluir que as mulheres são mais choronas, há situações específicas em que elas choram, senão mais, pelo menos muito. Causa? A hormona prolactina que, no pós-parto, é responsável pela produção de leite. "Parece que a influência desta hormona faz a mulher chorar mais porque a torna mais sensível a todos os pormenores e ao meio envolvente", justifica Ana Paula Nunes.
E, se a sociedade aceita que uma mulher ponha cá para fora tudo o que lhe vai na alma, com o homem não se passa o mesmo, arriscando mesmo a ser catalogado com alguns nomes menos bonitos. Mas em determinados momentos, até dos homens se exige um choro desalmado. Toda a gente cobra lágrimas nos velórios, nos funerais, nas situações trágicas. Porque isso desperta nos outros sentimentos de compaixão, solidariedade e humanidade. "Nessas situações até os homens devem chorar, porque os outros pensam: 'ele está a sofrer'. Há esta dicotomia nas exigências em relação ao homem. Não deve chorar, mas em determinadas circunstâncias da vida, espera-se que ele chore", diz Ana Paula Nunes.
Mas se chorar implica sempre uma emoção, nem sempre implica um sentimento. As crianças, os maiores chorões, só choram porque não falam - excepto quando esbarram numa porta -, ou seja, chorar é para elas uma forma de comunicação. A primeira do ser humano, verdade seja dita. E resulta...
Mas também se chora porque se está programado para tal. "Só o ser humano tem capacidade para chorar e está preparado anatomicamente para o fazer." - explica Ana Paula Nunes - "Temos canais lacrimais, glândulas lacrimais e um nariz proeminente. Quando choramos, impedimos que as bactérias se instalem. É como se fosse uma lavagem, um arrastamento de tudo o que é inalado."
Em termos sociais, se existem tantas culturas para tantas outras sociedades, uma coisa todas elas têm em comum: chorar. Porque toda a gente chora, independentemente do credo, da idade, da raça e... do sexo.

Razões do choro
Todos nós deixamo-nos levar pela emoção e choramos. Mas os motivos podem ser os mais variados. Porque se chorar é universal, é também um acto individual. Se exceptuarmos as carpideiras - mulheres pagas para chorar em funerais -, ninguém se junta para chorar. E depois há o momento. Aqueles em que nos sentimos mais frágeis emocionalmente e choramos pelo motivo mais banal.
Mas o que leva as mulheres a chorar? Muitas e variadas razões. O sofrimento nas crianças, a ansiedade, a tristeza, a solidão, a raiva, o mau trato dos animais, a morte de pessoas queridas, a felicidade e a saudade. Mas também há aquelas a que não se consegue fugir, como um filme inesquecível ou um livro, uma declaração de amor, um 'sim' comovido no casamento de uma amiga, o nascimento de uma criança. Há também quem se comova com o olhar tristonho do ET, que não consegue voltar para casa. Ou com um homem que chora. Mas o chorar não está sempre ligado a emoções negativas. Porque também se chora de felicidade, de alegria, de vitória. E as lágrimas também caiem, quando o riso é descontrolado, apesar de este ser um fenômeno puramente fisiológico. "Quando se ri muito, os olhos ficam cerrados e este abrir e fechar dos olhos provoca um estímulo nas glândulas lacrimais".
Os homens choram porque... não sabemos. Porque além de se pensar que eles não choram, eles próprios têm dificuldade em admitir que o fazem. Mas quando falam sobre isso, descobrimos que choram pelo mesmo que nós. Por tristeza ou alegria. Por injustiça ou amor. Por saudade e morte. Pelo nascimento de um filho. Mas não só. Alguns dos motivos que os fazem chorar desalmadamente, a nós não nos causam muita comoção. Como a vitória do seu clube no campeonato de futebol...

Chorar é bom
Apesar do choro ser saudável - excepto se estiver ligado a uma depressão -, para muitas culturas, chorar é sinal de fraqueza. E, na hora errada, pode mesmo ser fatal. No meio profissional, se uma mulher chora, porque sente que está a falhar, isso pode fazer com que perca o respeito dos outros. "Há contextos para se chorar, uns são valorizados, outros são ridicularizados e outros hipervalorizados, como numa situação de luto. O que se acha em relação ao choro, tem a ver com os contextos a ele associados", diz Ana Paula Nunes.
Por isso, se numa criança é normal o choro, a um adulto exige-se controlo. E é a maturidade que se adquire ao longo do crescimento, que nos permite avaliar as situações em que podemos chorar e aquelas em que é ridículo.
Mas com sentimentos negativos ou com a maior das alegrias, chorar é bom, saudável e recomenda-se. Equilibra o espírito e ajuda a aliviar a tensão.
"A seguir ao choro vem uma respiração mais forçada, com maior amplitude, que permite oxigenar o corpo. Para além de que pequenas toxinas são libertadas pelas lágrimas", explica 

No geral, homens têm vergonha de mostrar seus sentimentos
Os homens só têm "autorização" para chorar em circunstâncias especiais: quando sofrem uma grande perda, como a morte de um ente querido, diante de uma catástrofe como um atentado ou uma guerra, por um acontecimento esportivo, ou devido a um grande acontecimento familiar, como o casamento de um filho ou o nascimento do primeiro neto.
Isso é aceito como algo normal, parte da natureza masculina. Mas o problema é que muitos homens não apenas têm grandes dificuldades com as lágrimas, mas também com a expressão de seus sentimentos e emoções em geral. O temor, a compaixão e a ternura são um desafio para aqueles que têm uma emotividade rasa.
Segundo as últimas pesquisas, o fato de que muitos homens pareçam ter o "coração de gelo" não se deve somente ao fato de terem assumido um modelo social que atrofia-os emocionalmente, lhes ensina desde pequenos a não exteriorizar sua dor e a se aguentar  em nome de uma suposta força. A incapacidade de identificar e verbalizar emoções também pode ter uma dimensão patológica. É chamada alexitimia, uma alteração que se estima que afete uma em cada sete pessoas, e que atinge uma proporção mais elevada na população masculina que na feminina.
Os homens sofrem muito do mal de Alexitimia , não demonstram seus sentimentos jamais e nem choram em publico e como se fosse proibido homem chorar.

Causas da atrofia emocional
Segundo os especialistas, esta desordem pode ter origens neurológicas, como um dano acidental nos tecidos ocasionado por uma cirurgia cerebral ou uma disfunção na comunicação entre os hemisférios do cérebro que controlam respectivamente nossos lados racional e afetivo.
A incapacidade de sentir também pode ser causada por lesões: pode provir de uma desconexão entre o sistema límbico do cérebro, que detecta os estímulos fisiológicos que geram a emoção, e o neocórtex, que é a região encefálica que reconhece a emoção e permite expressá-la.
Outras causas de alexitimia são as psicoses, já que alguns transtornos, como a esquizofrenia, estão associados a uma grande apatia e a uma incapacidade de expressar as emoções, que só se revertem com medicação. Além disso, a baixa emocional, distorção anímica e desinteresse pelo que lhe rodeia que sofre uma pessoa depressiva, podem se associar a uma alexitimia transitória.
O estresse pós-traumático, devido a catástrofes, guerras, atentados ou situações traumáticas, também pode causar uma incapacidade emocional temporária como "efeito rebote", enquanto que a emotividade rasa também pode ser causada por uma educação deturpada: aqueles que cresceram em famílias onde os sentimentos raramente se expressavam ou era proibido expressá-los aprendem a reprimir o que sentem até negá-lo.
Para alguns especialistas, existe um componente genético familiar que predispõe a incapacidade emocional, e segundo outros, a alexitimia inclusive pode ter suas raízes na etapa da socialização primária, quando o bebê precisa de palavras para decodificar e comunicar suas experiências e a mãe não lhe dá os termos necessários para se expressar.
A alexitimia é difícil de tratar porque o afetado não tem consciência do problema e só vai a uma consulta quando alguém o sugere". A especialista afirma que esta desordem sempre requer um tratamento profissional, psicológico ou psiquiátrico, mas reconhece que "é muito difícil ajudar alguém a reconhecer e expressar suas emoções sem que o tenha feito desde criança e após ter passado a maior parte de sua vida sem vivências emocionais".
"Embora não se possa compensar a falta de aprendizado desde a infância, com treino pode-se ensinar o alexitímico a buscar elementos que ajudem-no a diferenciar suas emoções e expressá-las em um nível básico", explica a especialista.

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