A memória é um elemento indispensável ao fenômeno da
aprendizagem. A aprendizagem é definida como uma modificação relativamente duradoura do comportamento, através de
treino, experiência, observação. A memória está diretamente ligada à questão da
durabilidade da aprendizagem. Ou a modificação perdura por um espaço razoável
de tempo ou não se considera que houve aprendizagem.
Em geral, ao falar em memória, nos referimos à
capacidade de lembrar o que foi de algum modo vivido. Tentando abranger os diversos
aspectos do funcionamento da memória, diríamos que ela corresponde à aquisição, fixação, evocação e reconhecimento de
informações resultantes de percepção e aprendizagem.
Obviamente não se pode lembrar o que não se vivenciou. Aquisição
consiste no contato com a informação. Uma aula, uma leitura, uma troca de
idéias, uma reflexão ou mesmo o abrir os olhos para o ambiente nos
fornecem dados que poderão vir a ser percebidos. É importante destacar que nem
tudo o que ocorre à nossa volta é realmente adquirido. Quantas vezes estamos
olhando mas não estamos vendo, ou falam junto a nós e não ouvimos? É possível
alguém chegar ao final da leitura de uma página sem estar realmente adquirindo
nenhuma informação ali escrita. Tudo decorre muito da atenção da pessoa: para
onde se dirige o foco da atenção e qual a intensidade da atenção focalizada.
O aluno preparado em resolver um
problema pessoal pode ficar de tal modo atento a seu mundo interior que não
consegue prender-se à aula; na seqüência da reflexão descobre uma saída para o
problema e esta "saída" é também um dado "adquirido". A
aquisição não se refere apenas a impressões sensoriais (o que se vê, escuta
etc.); ela inclui tudo o que seja de alguma forma experienciado (vivido) pelo
sujeito.
O segundo atributo da memória é a fixação. De fato, nem todo o material
adquirido é retido. Você seria capaz de dizer o que comeu ontem e anteontem ao
almoço e ao jantar? Muitas pessoas não conseguem responder a essas perguntas,
embora estivessem muito atentas ao que comiam. De quantas pessoas não se diz
que deixaram "entrar por um ouvido e sair pelo outro" algum recado
recebido? Para a fixação exige-se, além de adequada aquisição, certo trabalho
de repetição ou "ruminação" que o aluno realiza quando estuda.
Adquirido e fixado o material, espera-se que se torne acessível a uma
evocação (que possa ser lembrado). Ao tentarmos recuperar uma informação
armazenada, costumamos evocar informações erradas junto à informação correta. É
como se a memória fosse um fichário, e ao recolhermos uma ficha, recolhêssemos
também as que lhe estivessem próximas. Nesse momento cumpre um trabalho de
reconhecimento, pelo qual o dado correto é identificado e utilizado, e os que
lhe vieram unidos são rejeitados.
Vários experimentos comprovam que a evocação é uma tarefa mais difícil
que o reconhecimento; afinal ela exige uma busca e uma decisão, enquanto este
só existe a decisão. Se eu pergunto ao aluno: "Quem descobriu o
Brasil?" estou exigindo dele: a) uma busca em seu fichário mental de vultos
da História do Brasil - é uma evocação; b) uma opção por determinado nome - é o
reconhecimento. Se, pelo contrário, escrevo os nomes de Pero Vaz de Caminha,
Dom Pedro I, Pedro Álvares Cabral e Cristóvão Colombo, para que seja
assinalado o nome do descobridor do Brasil, o trabalho será unicamente de
reconhecimento, uma vez que o próprio enunciado já apresenta a evocação.
Estágios
O psicólogo norte-americano Klaumeier, resumindo muitas pesquisas e
teorizações sobre os atributos de aquisição e fixação, distribui em três
estágios a ocorrência destas operações:
·
Memória sensorial - Retém a informação
por alguns segundos ou frações de segundos apenas. Sua capacidade é muito
pequena e ela precisa "esvaziar-se" logo, para dar espaço a outras
impressões sensoriais.
·
Memória a curto prazo - Já deve ter
acontecido de você precisar telefonar para alguém e não saber o número.
Consultando a lista, você consegue ler e memorizar o número por mais de um ou
dois segundos. No dia seguinte, porém, provavelmente não saberá mais. A memória
a curto prazo recebe material da memória sensorial e consegue reter por mais
tempo (até um minuto, aproximadamente) quantidade um pouco maior de
informações.
·
Memória a longo prazo - Chegada a este
ponto, a mensagem precisa ser deixada "em repouso" para um período de
consolidação, que varia de quinze minutos a uma hora mais ou menos. Após esse
período, pode considerar-se fixada por tempo indefinido, mesmo que venha a ser
esquecida. Pessoas de idade avançada são capazes de lembrar-se com detalhes de
fatos ocorridos na infância que estiveram esquecidos durante anos e anos. A
memória a longo prazo seria como um reservatório permanente de informações,
embora essas informações não sejam o tempo todo presentes na lembrança.
Significado do Material
A fixação e a evocação serão tanto maiores quanto maior for o significado do
material.
Pesquisas mostram que um pequeno texto compreensível é mais facilmente
memorizado que uma seqüência de palavras sem relação umas com as outras. Uma
série de truques conhecidos como artifícios mnemônicos podem ser
criados para dar mais sentido ao material. Por exemplo: para decorar a tabela
periódica, inventa-se frases ou musiquinhas. A memória também fica facilitada
com o aproveitamento do recursos acústico, como juntar palavras que rimem ou
comecem com mesmo som.
A questão do significado deve ser abordada por um segundo prisma. Além
de um significado interno, isto é, de o assunto fazer sentido, é preciso
considerar o significado subjetivo. O que representa este assunto para mim? Que
utilidade pode ter em minha vida? O assunto me agrada? Se o estudante sente-se
envolvido de alguma forma, se consegue ver a importância do assunto, ele
encontra interesse em estudar aquela matéria, assim o assunto lhe parecerá mais
entendível e memorizável. Em outras palavras: motivado, o aluno apresenta
uma disposição mental favorável.
Não é demais insistir na importância de um clima descontraído na sala de
aula, de relações aluno-professor calcadas no respeito mútuo, de um ambiente
propício à indagação. É preciso destacar também que o fato de saber que vai ser
examinado influi na disposição mental para a memorização. Uma coisa é ler sem
compromisso, outra é ler predisposto mentalmente a fixar.
Esquecimento
Quem aprende está sujeito a esquecer.
Mas, pelo que indicam inúmeras pesquisas, nunca chega a desaparecer totalmente
aquilo que foi de fato aprendido, isto é, o que conseguiu se consolidar na
memória a longo prazo. Pode ficar esquecido e nos frustrar no momento em que
precisamos da informação, mas não desaparece. Um dia qualquer, mediante alguma
associação que fazemos, ou mesmo aparentemente de modo espontâneo, a lembrança
antiga nos surpreende.
Como se da o esquecimento?
Não falaremos nos efeitos do cansaço, das doenças ou do envelhecimento, fatores
que se colocam a nível biológico. Numa análise psicológica, podemos apontar
como fatores responsáveis pelo esquecimento:
1. fragilidade da
aprendizagem;
2. tentativa de
evocação mediante critério diferente do usado na fixação;
3. alteração sofrida
pela informação.
Estudo insuficiente pode ocasionar fragilidade da aprendizagem. A
informação consegue chegar até a memória a longo prazo, mas não tarde a começar
a enfraquecer. Para evitar isso, aconselha-se ao estudante fazer a
chamada "superaprendizagem", isto é, estudar a
matéria além do mínimo necessário para lembrar-se dela daí a pouco; fazer
repetições, recordações; testar-se aqui e ali durante o estudo. A
"superaprendizagem" fortalece a fixação.
O segundo fator apontado para o
esquecimento pode ser exemplificado como no caso da tabela periódica. Se, para
fixá-la na memória usarmos frases, teremos, para evocá-la, de recorrer à mesma
frase. Sem essa "chave", provavelmente não conseguiremos reproduzir a
tabela. Linhas atrás sugerimos a comparação da memória com um fichário. Pois
bem: se uma ficha foi organizada através de certa regra, é preciso usar a mesma
regra para encontrá-la.
O terceiro fator apontado para o
esquecimento foram as alterações sofridas pela informação. Isto pode ocorrer de
vários modos. O modo mais simples seria o desuso, ou a falta de utilização. Uma
pessoa que trabalhe no comércio, constantemente calculando preços e dando
trocos, não esquece as tabuadas. Por outro lado, o que se aprende mas não se aplica
cai no esquecimento. Aqui não se trata de enfraquecimento por deficiência na
aquisição ou fixação. Supõe-se uma aprendizagem bem estabelecida de início que
se desfaz pela falta de uso.
O enfraquecimento também pode ocorrer por razões emocionais. É mais
fácil memorizar aquilo de que gostamos, que está conforme nossos valores e
expectativas. Conseqüentemente, esquecemos aquilo que nos desagrada ou que vai
contra nossas convicções e preferências. Neste sentido, afirma-se que o
esquecimento é seletivo. Informações
geradoras de ansiedade são naturalmente esquecidas, livrando o psiquismo - pelo
menos momentaneamente - de preocupações desagradáveis. É possível que o aluno
afirme ter esquecido que haveria prova e não esteja faltando com a verdade.
O estado emocional pode ainda provocar "brancos" momentâneos.
A tensão derivada de uma excessiva
preocupação em não esquecer acaba levando ao esquecimento. Sobrecarga de
preocupação de qualquer tipo faz o mesmo. É questão bastante conhecida e
admitida por todos que uma relativa tranqüilidade se torna necessária para
alguém poder demonstrar o que aprendeu.
Para finalizar, convém deixar bem
estabelecido que a memória não tem um funcionamento isolado. Ela integra o
complexo intelectual da pessoa. Nossa maneira de ver o mundo, de perceber a
realidade é fruto do que sabemos (memorizamos) sobre as coisas. A memória é um
dos fatores da inteligência e funciona integrada com ela. Por outro lado, a
inteligência não existe sozinha. O que existe é uma pessoa. Pensamentos, sentimentos
e ações são possibilidades de uma pessoa. Portanto a memória tanto influencia o
estado geral da pessoa como sofre influência desse estado.
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