quarta-feira, 1 de maio de 2013

Usando melhor a memória




A memória é um elemento indispensável ao fenômeno da aprendizagem. A aprendizagem é definida como uma modificação relativamente duradoura do comportamento, através de treino, experiência, observação. A memória está diretamente ligada à questão da durabilidade da aprendizagem. Ou a modificação perdura por um espaço razoável de tempo ou não se considera que houve aprendizagem.
Em geral, ao falar em memória, nos referimos à capacidade de lembrar o que foi de algum modo vivido. Tentando abranger os diversos aspectos do funcionamento da memória, diríamos que ela corresponde à aquisição, fixação, evocação e reconhecimento  de informações resultantes de percepção e aprendizagem.

Obviamente não se pode lembrar o que não se vivenciou. Aquisição consiste no contato com a informação. Uma aula, uma leitura, uma troca de idéias, uma reflexão ou mesmo o abrir os olhos para o ambiente nos fornecem dados que poderão vir a ser percebidos. É importante destacar que nem tudo o que ocorre à nossa volta é realmente adquirido. Quantas vezes estamos olhando mas não estamos vendo, ou falam junto a nós e não ouvimos? É possível alguém chegar ao final da leitura de uma página sem estar realmente adquirindo nenhuma informação ali escrita. Tudo decorre muito da atenção da pessoa: para onde se dirige o foco da atenção e qual a intensidade da atenção focalizada.

O aluno preparado em resolver um problema pessoal pode ficar de tal modo atento a seu mundo interior que não consegue prender-se à aula; na seqüência da reflexão descobre uma saída para o problema e esta "saída" é também um dado "adquirido". A aquisição não se refere apenas a impressões sensoriais (o que se vê, escuta etc.); ela inclui tudo o que seja de alguma forma experienciado (vivido) pelo sujeito.

O segundo atributo da memória é a fixação. De fato, nem todo o material adquirido é retido. Você seria capaz de dizer o que comeu ontem e anteontem ao almoço e ao jantar? Muitas pessoas não conseguem responder a essas perguntas, embora estivessem muito atentas ao que comiam. De quantas pessoas não se diz que deixaram "entrar por um ouvido e sair pelo outro" algum recado recebido? Para a fixação exige-se, além de adequada aquisição, certo trabalho de repetição ou "ruminação" que o aluno realiza quando estuda.

Adquirido e fixado o material, espera-se que se torne acessível a uma evocação (que possa ser lembrado). Ao tentarmos recuperar uma informação armazenada, costumamos evocar informações erradas junto à informação correta. É como se a memória fosse um fichário, e ao recolhermos uma ficha, recolhêssemos também as que lhe estivessem próximas. Nesse momento cumpre um trabalho de reconhecimento, pelo qual o dado correto é identificado e utilizado, e os que lhe vieram unidos são rejeitados.

Vários experimentos comprovam que a evocação é uma tarefa mais difícil que o reconhecimento; afinal ela exige uma busca e uma decisão, enquanto este só existe a decisão. Se eu pergunto ao aluno: "Quem descobriu o Brasil?" estou exigindo dele: a) uma busca em seu fichário mental de vultos da História do Brasil - é uma evocação; b) uma opção por determinado nome - é o reconhecimento. Se, pelo contrário, escrevo os nomes de Pero Vaz de Caminha, Dom Pedro I, Pedro Álvares Cabral e Cristóvão Colombo, para que seja assinalado o nome do descobridor do Brasil, o trabalho será unicamente de reconhecimento, uma vez que o próprio enunciado já apresenta a evocação.

Estágios
O psicólogo norte-americano Klaumeier, resumindo muitas pesquisas e teorizações sobre os atributos de aquisição e fixação, distribui em três estágios a ocorrência destas operações:
·         Memória sensorial - Retém a informação por alguns segundos ou frações de segundos apenas. Sua capacidade é muito pequena e ela precisa "esvaziar-se" logo, para dar espaço a outras impressões sensoriais.
·         Memória a curto prazo - Já deve ter acontecido de você precisar telefonar para alguém e não saber o número. Consultando a lista, você consegue ler e memorizar o número por mais de um ou dois segundos. No dia seguinte, porém, provavelmente não saberá mais. A memória a curto prazo recebe material da memória sensorial e consegue reter por mais tempo (até um minuto, aproximadamente) quantidade um pouco maior de informações.
·         Memória a longo prazo - Chegada a este ponto, a mensagem precisa ser deixada "em repouso" para um período de consolidação, que varia de quinze minutos a uma hora mais ou menos. Após esse período, pode considerar-se fixada por tempo indefinido, mesmo que venha a ser esquecida. Pessoas de idade avançada são capazes de lembrar-se com detalhes de fatos ocorridos na infância que estiveram esquecidos durante anos e anos. A memória a longo prazo seria como um reservatório permanente de informações, embora essas informações não sejam o tempo todo presentes na lembrança.
Significado do Material
A fixação e a evocação serão tanto maiores quanto maior for o significado do material.

Pesquisas mostram que um pequeno texto compreensível é mais facilmente memorizado que uma seqüência de palavras sem relação umas com as outras. Uma série de truques conhecidos como artifícios mnemônicos podem ser criados para dar mais sentido ao material. Por exemplo: para decorar a tabela periódica, inventa-se frases ou musiquinhas. A memória também fica facilitada com o aproveitamento do recursos acústico, como juntar palavras que rimem ou comecem com mesmo som. 

A questão do significado deve ser abordada por um segundo prisma. Além de um significado interno, isto é, de o assunto fazer sentido, é preciso considerar o significado subjetivo. O que representa este assunto para mim? Que utilidade pode ter em minha vida? O assunto me agrada? Se o estudante sente-se envolvido de alguma forma, se consegue ver a importância do assunto, ele encontra interesse em estudar aquela matéria, assim o assunto lhe parecerá mais entendível e memorizável. Em outras palavras: motivado, o aluno apresenta uma disposição mental favorável.

Não é demais insistir na importância de um clima descontraído na sala de aula, de relações aluno-professor calcadas no respeito mútuo, de um ambiente propício à indagação. É preciso destacar também que o fato de saber que vai ser examinado influi na disposição mental para a memorização. Uma coisa é ler sem compromisso, outra é ler predisposto mentalmente a fixar.

Esquecimento
Quem aprende está sujeito a esquecer. Mas, pelo que indicam inúmeras pesquisas, nunca chega a desaparecer totalmente aquilo que foi de fato aprendido, isto é, o que conseguiu se consolidar na memória a longo prazo. Pode ficar esquecido e nos frustrar no momento em que precisamos da informação, mas não desaparece. Um dia qualquer, mediante alguma associação que fazemos, ou mesmo aparentemente de modo espontâneo, a lembrança antiga nos surpreende.

Como se da o esquecimento?
Não falaremos nos efeitos do cansaço, das doenças ou do envelhecimento, fatores que se colocam a nível biológico. Numa análise psicológica, podemos apontar como fatores responsáveis pelo esquecimento:

1.     fragilidade da aprendizagem;
2.     tentativa de evocação mediante critério diferente do usado na fixação;
3.     alteração sofrida pela informação.
Estudo insuficiente pode ocasionar fragilidade da aprendizagem. A informação consegue chegar até a memória a longo prazo, mas não tarde a começar a enfraquecer. Para evitar isso, aconselha-se ao estudante fazer a chamada "superaprendizagem", isto é, estudar a matéria além do mínimo necessário para lembrar-se dela daí a pouco; fazer repetições, recordações; testar-se aqui e ali durante o estudo. A "superaprendizagem" fortalece a fixação.

O segundo fator apontado para o esquecimento pode ser exemplificado como no caso da tabela periódica. Se, para fixá-la na memória usarmos frases, teremos, para evocá-la, de recorrer à mesma frase. Sem essa "chave", provavelmente não conseguiremos reproduzir a tabela. Linhas atrás sugerimos a comparação da memória com um fichário. Pois bem: se uma ficha foi organizada através de certa regra, é preciso usar a mesma regra para encontrá-la.
O terceiro fator apontado para o esquecimento foram as alterações sofridas pela informação. Isto pode ocorrer de vários modos. O modo mais simples seria o desuso, ou a falta de utilização. Uma pessoa que trabalhe no comércio, constantemente calculando preços e dando trocos, não esquece as tabuadas. Por outro lado, o que se aprende mas não se aplica cai no esquecimento. Aqui não se trata de enfraquecimento por deficiência na aquisição ou fixação. Supõe-se uma aprendizagem bem estabelecida de início que se desfaz pela falta de uso.

O enfraquecimento também pode ocorrer por razões emocionais. É mais fácil memorizar aquilo de que gostamos, que está conforme nossos valores e expectativas. Conseqüentemente, esquecemos aquilo que nos desagrada ou que vai contra nossas convicções e preferências. Neste sentido, afirma-se que o esquecimento é seletivo. Informações geradoras de ansiedade são naturalmente esquecidas, livrando o psiquismo - pelo menos momentaneamente - de preocupações desagradáveis. É possível que o aluno afirme ter esquecido que haveria prova e não esteja faltando com a verdade.

O estado emocional pode ainda provocar "brancos" momentâneos. A tensão derivada de uma excessiva 
preocupação em não esquecer acaba levando ao esquecimento. Sobrecarga de preocupação de qualquer tipo faz o mesmo. É questão bastante conhecida e admitida por todos que uma relativa tranqüilidade se torna necessária para alguém poder demonstrar o que aprendeu.


Para finalizar, convém deixar bem estabelecido que a memória não tem um funcionamento isolado. Ela integra o complexo intelectual da pessoa. Nossa maneira de ver o mundo, de perceber a realidade é fruto do que sabemos (memorizamos) sobre as coisas. A memória é um dos fatores da inteligência e funciona integrada com ela. Por outro lado, a inteligência não existe sozinha. O que existe é uma pessoa. Pensamentos, sentimentos e ações são possibilidades de uma pessoa. Portanto a memória tanto influencia o estado geral da pessoa como sofre influência desse estado.


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