INTRODUÇÃO E DEFINIÇÕES
A doença de Parkinson (DP), antigamente vista como uma doença com manifestações puramente motoras, segundo as primeiras descrições de James Parkinson, atualmente é tida como uma doença com as mais diversas apresentações. Devido ao aumento da sobrevida da nossa população e, com isso, à maior prevalência de doenças degenerativas, é fundamental que o clínico saiba reconhecer os sintomas dessa doença e que tenha familiaridade com o tratamento para permitir uma melhor qualidade de vida ao paciente.
O paciente com DP, na maioria dos casos, procura auxilio médico com queixa de tremor, porém outras apresentações podem ser vistas e, por serem menos comuns, são mais dificilmente reconhecidas. Para o diagnóstico de parkinsonismo, a presença de pelo menos dois dos sinais cardinais abaixo são essenciais:
A presença de dois desses quatro sinais leva ao diagnóstico de parkinsonismo. A avaliação clínica completa ajudará a esclarecer o diagnóstico etiológico entre DP ou outras formas de parkinsonismo.
ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
A etiologia da DP é tida atualmente como multifatorial. A influência genética tem se comprovado pela detecção de diversos genes que estão relacionados com parkinsonismos familiares, mais comumente descritos em indivíduos mais jovens, como os genes PARKIN. Dos fatores ambientais, o contato com alguns pesticidas e com metais ambientais também encontra relatos como desencadeadores de DP
A presença dos corpúsculos de Lewy em estudo anatomopatológico, apesar de característica, não é patognomônica da DP, ocorrendo também em outros parkinsonismos e na síndrome de Down. Sabe-se que a formação destes está relacionada com a degradação anormal de proteínas intracelulares, gerando o acúmulo anormal de alfa-sinucleína. Esse acúmulo acaba interferindo no metabolismo celular. Há teorias que defendem o bulbo ofatório como o local inicial desse processo de acúmulo de alfa-sinucleía, que se espalha para outras áreas do cérebro com o avançar da doença.
Em termos de funcionamento, as estruturas dos núcleos da base atuam como moduladoras do movimento, tendo mecanismos tanto de facilitação (via direta) como de inibição do movimento (via indireta) a ser gerado pelos neurônios corticias. Sabemos que o principal substrato patológico da DP é a degeneração dos neurônios dopaminérgicos localizados na substancia negra pars compacta, e esses neurônios, mediante a atuação da dopamina em diferentes receptores, são responsáveis pelo aumento da atividade da via direta e inibição da atividade da via indireta, portanto, incentivando o movimento de forma bimodal. Com a ausência da dopamina ocorre aumento da atividade na via indireta, levando a pobreza e lentidão dos movimentos característicos do parkinsonismo. Esse modelo ainda tem muitas falhas metodológicas e não explica a totalidade das manifestações clínicas da DP.
ACHADOS CLÍNICOS
História Clínica
O paciente, cuja idade pode variar desde a adolescência (nas formas mais precoces) até idades bem avançadas, costuma ser alertado por familiares de que algo não está normal no seu andar, ou que começaram a notar um tremor ou ainda o paciente apresenta dor em extremidade, sem outra causa aparente.
A DP, de modo didático, tem duas formas básicas de apresentação: tremulante e rígido-acinética. A forma tremulante apresenta-se como tremor de repouso, unilateral, de início insidioso e piora progressiva, geralmente em meses ou anos, que evolui com o acometimento das demais extremidades e de segmento cervical com o evoluir da doença. Tipicamente, o paciente refere que o tremor desaparece quando ele vai pegar uma xícara ou está fazendo alguma atividade e piora quando está mais relaxado ou quando deambula (tremor de repouso). Essa forma é a que ocorre na maioria dos casos de DP idiopático. A forma rígido-acinética, por sua vez, é mais dificilmente reconhecida. Nota-se uma maior lentidão para realizar atividades cotidianas; algumas vezes, os familiares referem que o paciente passou a andar mais devagar, com passos curtos. Em alguns casos, essa pobreza de movimentos chega a ser tão marcante em somente um dos hemicorpos que o paciente recebe o diagnóstico errôneo de doença cérebro-vascular. Esses casos podem passar anos despercebidos, e, em casos extremos, por até uma década.
Os pacientes com DP também apresentam manifestações não motoras da doença. Dentre elas, podemos destacar as seguintes:
Diversas
hipóteses tem sido propostas para explicar a origem da DP. Para cada uma delas
há pontos a favor e pontos contrários, de modo que se pode pensar que a origem
da doença se deva a uma combinação de, talvez, destes factores aliados a outros
que possam vir a ser descobertos.
Actualmente
há cinco linhas de raciocínio de maior interesse no que se refere a etiologia
da DP:
·
Acção de
neurotoxinas ambientais
·
Produção de
radicais livres
·
Anormalidades
mitocondriais
·
Predisposição
genética
·
Envelhecimento
cerebral
2.1 - Ação de neurotoxinas ambientais
Tal hipótese baseia-se primariamente no achado de que a substância
1-metil-4-fenil-1-2-3-6-tetraidropiridina (MPTP, constatado em 1976 após um
"surto" de parkinsonismo em usuários de uma determinada remessa de
heroína nos EUA) destrói selectivamente
neurónios dopaminérgicos da SNc (substância negra compacta). A MPTP deve ser
oxidada a MPP+ pela enzima MAO-B (momoamina oxidase B) para ser neurotóxica. O
MPP+ é captado por terminais dopaminérgicos e após ser interiorizado inibe a
enzima NADH Co Q1 redutase, uma enzima mitocondrial que actua na cadeia
respiratória. Digno de nota o facto que drogas que bloqueiam a MAO-B, como a
selegilina, bloqueiam a toxicidade do MPTP.
O
quadro parkinssoniano induzido pelo MPTP não é idêntico a DP, tendo o paciente
menos tremor, maior comprometimento de equilíbrio e marcha e prejuízo cognitivo
mais evidente. Estudos em primatas não demonstraram de maneira definitiva que o
quadro induzido pelo MPTP induza degeneração de neurónios colinérgicos ou
aparecimentos de corpos de Lewy no córtex cerebral, tal como ocorre na DP.
Alguns
estudos tem constatado uma maior incidência de DP em populações expostas a
toxinas agro-industriais e água de poço. Entretanto, a exposição repetida e
prolongada a determinada toxina parece improvável, uma vez que a taxa de
concordância em indivíduos que vivem longos períodos próximos é bastante baixa.
2.2
- Produção de radicais livres
O
metabolismo normal da dopamina produz radicais hidroxila e peróxido de
hidrogénio, os quais na presença de depósitos de ferro no cérebro, poderiam
resultar em neurotoxidade por interferência na cadeia respiratória celular.
Apesar das evidências de que a SNc se encontra sob stress oxidativo na DP, não
se sabe se isto seria o evento primário ou secundário a algum outro mecanismo.
2.3
- Anormalidades mitocondriais
Já
se falou anteriormente do papel da NADH Co Q1 redutase na respiração celular.
Acrescenta-se a isso que a inibição desta enzima leva a produção excessiva de
radicais peróxido. Nesse caso, uma deficiência genética ou secundária na cadeia
respiratória poderia gerar produtos de oxidação e desencadear uma série de
processos que levaria a toxicidade celular.
2.4
- Predisposição genética
A
participação de factores genéticos poderia contribuir para a degeneração
celular através de vários mecanismos, entre eles: susceptibilidade
geneticamente determinada a toxinas ambientais e defeito capaz de gerar toxinas
endógenas e/ou dificultar a sua remoção.
2.5
- Envelhecimento cerebral
Estudos histológicos e neuroquímicos mostram que a
SNc é particularmente sensível ao envelhecimento em relação a outras estruturas
cerebrais. Entretanto há evidências que tornam tal mecanismo pouco provável. A
fase pré-sintomática da DP não é maior que 5 anos; a perda neuronal na SNc é de
cerca de 45% na primeira década da doença enquanto em indivíduos normais era de
apenas 4,7%. Finalmente, constatou-se por estudos anatomopatológicos que a
porção da SNc que mais sofre degeneração é a região dorsal, enquanto que na DP
a região mais afetada é a ventor-lateral, cujos neurônios projectam para o putâmem.
3 - Circuitos
motores
Fora Meynert (1871) quem primeiro sugeriu
que na DP haveria um funcionamento defeituoso dos núcleos da base. Os núcleos
da base são massas de substância cinzenta distribuídas pelo cérebro(figura 1). No caso do
distúrbio motor da DP é sugerido que a falta da estimulação dopaminérgica de
neurónios GABAérgicos do striatum (putâmem e núcleo caudado) que inibem a SNr
(substância negra reticulata) e o Gpi (globo pálido interno); e da inibição
dopaminérgica de neurónios GABAérgicos do striatum que inibem o Gpe (globo
pálido externo) levaria a um aumento do "tônus" inibitório sobre o
tálamo ventro-lateral. Assim o córtex cerebral receberia menor estímulo para
iniciar o movimento (figura 2, áreas muito inibidas em cinza escuro, áreas menos
inibidas em cinza claro).
4
- Quadro clínico
A
clínica da DP comporta sinais motores e cognitivos, entre outros. Para fins de
publicação científica é necessário que o paciente apresente, no mínimo, dois
sinais essenciais da doença. Por este lado, vê-se que o diagnóstico é muitas
vezes complicado, visto que os sinais não aparecerão necessariamente num mesmo
momento. Um paciente poderá ter, por exemplo, somente o tremor no início de sua
doença.
Deve-se
saber que não existe ainda um marcador biológico para o diagnóstico da DP. a
propedêutica complementar é usada mais frequentemente para excluir os pacientes
que não tem a DP que para afirmamos os que a têm. Deste modo, a avaliação
clínica criteriosa ainda é o fator essencial
para o correto diagnóstico.
A
DP é essencialmente uma doença crónica de carácter progressivo, sendo que os
sintomas costumam ter início insidioso e assimétrico. Um início abrupto
de sintomas faz com que devamos considerar mais um quadro de parkinsonismo de
outra espécie que não a DP. Veremos agora uma breve descrição dos quatro sinais
essenciais da DP e de características que falam a favor de outra forma de
parkinsonismo que não a DP.
.
Sintomatologia
Alguns dos sintomas preliminares da doença de
Parkinson. É importante salientar que nem todos os pacientes sofrem dos mesmos
sintomas.
Rigidez
Rigidez
aumentada nos músculos. A menos que seja facilitada temporariamente por
medicamentos de anti-Parkinson, a rigidez estará sempre presente. Entretanto,
aumenta durante o movimento. É frequentemente responsável por um rosto marcado
por um certo tipo de aparência. Em alguns pacientes, a rigidez conduz à
sensação de dor, especialmente nos braços e ombros.
A
rigidez parkinsoniana é plástica ou cérea, sendo diferente da rigidez elástica
característica de lesões do sistema piramidal. Acomete um segmento, um hemicarpo ou ambos
os lados, acometendo todos os músculos indistintamente. O deslocamento a
movimentação passiva é uniforme, podendo estar presente o sinal da roda
dentada. A rigidez compartilha com o tremor oposto de manifestações iniciais da
doença na maior parte dos casos. Uma explicação seria que estes sintomas
"positivos" seriam mais bem percebidos pelo paciente que
o fenômeno negativo (bradicinesia).
A
rigidez pode estar ausente nas fases iniciais da doença. Uma forma de
sensibiliza-la no exame neurológico seria a manobra de co-activação. Nesta o
paciente é solicitado a realizar voluntariamente, na articulação contralateral,
"em espelho", o mesmo movimento que está sendo realizado na
articulação testada com movimentação passiva. Pode aparecer uma nítida rigidez
com sinal da roda dentada na articulação testada
Tremor
O tremor é o sintoma que o público identifica mais
frequentemente com a doença de Parkinson, mas de facto, mais de 25% dos
pacientes apresentam apenas um tremor muito ligeiro ou mesmo nenhum. Quando
está presente, o tremor pode ser pior num só lado do corpo. Além de afetar os membros, envolve às vezes a cabeça, a
garganta, a cara, e os maxilares.
O
tremor parkinsoniano mais típico é observado durante o repouso, diminuindo ou
desaparecendo quando se inicia o movimento. Este tremor pode ainda se
manifestar na manutenção prolongada de uma postura. A frequência do tremor é de
cerca de 4 a 6 Hz. Na forma de DP com tremor predominante (DP benigna), este
pode ser de frequência menor.
O
tremor acomete preferencialmente os membros, podendo acometer o segmento
cefálico (neste, o mais comum é o "bater de dentes"). Na sua forma
mais conhecida acomete os dedos das mãos tendo a característica de "contar
dinheiro" ou "rolar pílulas". Formas de tremores mais complexas
podem ser encontradas, entretanto. Uma forma de sensibilizar este sinal em
pacientes que não o estejam manifestando continuamente ou claramente consiste
em fazer com que o paciente se abstraia com cálculos mentais.
Bradicinesia
A
bradicinesia significa a lentidão do movimento. Este sintoma é caracterizado
pelo atraso em iniciar os movimentos, causados pelo demora do cérebro em
transmitir as instruções necessárias às partes apropriadas do corpo. Quando as
instruções são recebidas, o corpo responde lentamente em enviá-las para fora.
Este
sinal é o que mais serve para diferenciar o parkinsonismo de outras alterações
motoras. Corresponde a uma lentidão dos movimentos, especialmente os
automáticos, havendo uma pobreza geral da movimentação.
A mímica
é pobre (hipomimia ou amimia), sendo a fácies inexpressiva ou congelada. A fala
é monótona e sem modulação (fala monocórdica), e no fim de uma frase o doente
pode repetir palavras ou sílabas (palilalia). A escrita modifica-se estando
presente a micrografia. Ainda estará presente a dissinergia oculocefálica, na
qual o doente, ao dirigir os olhos para um determinado lado, não acompanha com
a cabeça o movimento dos olhos.
Uma
forma de avaliar a bradicinesia de maneira objectiva consiste em pedir
ao paciente que faça movimentos repetidos e sucessivos, como abrir e
fechar o punho, ou tocar o dedo indicador contra o polegar ou mesmo bater o
calcanhar contra o solo. Há uma tendência de que com a repetição dos movimentos
estes se tornem mais lentos e de menor amplitude, podendo ter até períodos de
completa interrupção.
Instabilidade
postural
Este
sinal é algumas vezes colocado como fazendo parte da rigidez muscular. O
seu achado deve-se à perda de reflexos posturais. A propriocepção muscular e
articular, o sistema vestibular e a visão são algumas das fontes de alimentação
do sistema extrapiramidal no controle do tono postural.Os pacientes assumem uma
postura muito característica com a cabeça em ligeira flexão, tronco
ligeiramente inclinado para a frente, flexão moderada da perna sobre a coxa e
do antebraço sobre o braço, com exagero da pinça digital nas mãos. o tronco
flectidos ventralmente. A imagem lembra a de um esquiador. Em pacientes com
este sinal predominante costuma-se ter uma morbidade maior e uma progressão
mais rápida da doença (DP maligna).
OBSERVAÇÃO:
Outros sinais e sintomas que podem estar presentes na DP são o exagero dos
reflexos axiais da face (particularmente o orbicular das pálpebras), sialorreia (que
geralmente traduz bradicinesia), hipersecreção sebácea
(fácies empomadada), edema de membros inferiores, depressão do humor, quadro de
inquietação muscular (acatisia). O défice cognitivo é quase uma constante nos
pacientes com DP.
4.2
- Sinais de alerta para outra causa do parkinsonismo que não a
DP
Estes
sinais não invalidam o diagnóstico de DP, entretanto devem ser motivo de alerta
e reflexão:
- Quedas precoces: as quedas ocorrem geralmente em fases mais avançadas da doença
(acima do estágio 3 de Hoehn e Yahr). Quedas frequentes e de início
precoce sugerem outro quadro, como a paralisia supranuclear progressiva
(PSP). O mesmo ocorre em pacientes que têm paralisia do olhar conjugado,
principalmente do olhar vertical para baixo, que não ocorre na DP.
- Progressão muito rápida: a DP evolui geralmente de maneira lenta,
principalmente em pacientes mais jovens.
- "Parkinsonismo da metade inferior":
é atribuída aos pacientes que apresentam típica marcha parkinsoniana, a
pequenos passos, com festinação e bloqueios, porém completamente isentos
de qualquer outro sinal parkinsoniano. Não se trata de DP, sendo que
corresponde ao comprometimento de estruturas profundas próximas aos
núcleos da base ou mesmo os incluindo, devido a lesões vasculares
lacunares, hidrocefalia ou mesmo enfermidades como a encefalopatia
arterioesclerótica subcortical de Binswanger. Este distúrbio não apresenta
resposta satisfatória a levodopa.
- Desfalecimentos seguindo a hipotensão
postural: este sinal de disautonomia pode ocorrer
no curso da DP, porém costuma ser trazida pela medicação (levodopa,
antidepressivos tricíclicos, agonistas dopaminérgicos directos, como a
bromocriptina, pergolida e lisurida). A ocorrência precoce deste quadro,
principalmente acompanhada de outros sinais disautonômicos (incontinência
urinária e fecal, impotência sexual em jovens) sugere uma degeneração do
sistema nervoso autónomo, como a que ocorre na síndrome de Shy-Drager.
- Sinais piramidais ou cerebelares: não são encontrados na DP, excepto se
houver lesão paralela de outra origem. A atrofia olivopontocerebelar
isolada ou familiar é o quadro que deve ser de imediato lembrado em caso
de sinais cerebelares com parkinsonismo. Pacientes muito jovens (abaixo
dos 30 anos) com sinais piramidais e parkinsonismo, devem ser suspeitos de
apresentar uma degeneração pálido-piramidal.
- Estridor laríngeo: pode ocorrer na DP, entretanto é característica de degeneração
estriatonigral.
- Incontinência emocional: são manifestações de comprometimento
bilateral das conexões aferentes supra-segmentares do tronco-cerebral, de
natureza vascular na maioria das vezes. Pode significar um parkinsonismo
secundário a lesões vasculares múltiplas.
- Palilalia: é muito raro na DP. Costuma ocorrer em outras formas de
degeneração, como na degeneração estriatonigral.
- Demência: sempre que ocorre devemos nos deter na busca de um diagnóstico
alternativo, especialmente se evoluir rapidamente ou com outras
manifestações neurológicas (doença de Alzheimer, degeneração
córtico-basal, doença de Creutzfeldt-Jakob, hidrocefalia de pressão
normal, naeuroacantocitose, doença de Huntington juvenil, entre outras).
- Inibição do músculo elevador da pálpebra ou
"apraxia da abertura dos olhos": não parece se tratar realmente
de um fenómeno apráxico, mas uma dissinergia do mecanismo de inibição e
desinibição recíproca dos músculos orbiculares dos olhos e dos elevadores
das pálpebras. Pode ocorrer simultâneamente com blefaroespasmo. Na DP é
pouco frequente, sendo encontrado mais em casos de Parkinsonismo-plus.
OBSERVAÇÃO:
O tratamento com levodopa pode induzir complicações que irão modificar o padrão
de manifestação clínica do paciente. Estes efeitos não serão discutidos
neste texto.
5 - Classificação
Deve-se
definir primeiramente o que vem a ser parkinsonismo. Este define-se como uma
ampla categoria de doenças que apresentam uma síndrome clínica semelhante à DP,
com a presença de tremor de repouso, rigidez muscular plástica,
bradicinesia e instabilidade postural. Associado a estes sinais podem
ser encontrados sinais piramidais, alterações da motilidade ocular extrínseca,
sinais cerebelares, de disfunção autonómica, de neuropatia periférica e de
disfunção cognitiva. Os termos síndrome parkinsoniana e síndrome
rígido-acinética também são usados para descrever o mesmo quadro.
O
diagnóstico diferencial adequado entre estas várias enfermidades nem sempre é
possível. Hughes e colaboradores, em 1992, realizaram um estudo clínico-patológico
em que avaliaram a precisão do diagnóstico clínico da doença de Parkinson
idiopática (DP), concluindo que 20% dos pacientes que tinham o diagnóstico
clínico de DP apresentavam, na verdade, outro diagnóstico anatomopatológico.
Por outro lado, também pacientes que tinham quadro clínico de DP atípico
apresentavam exame anatomopatológico característico de DP.
6
- Diagnóstico diferencial
Deve-se
pensar, em primeiro lugar, em condições não parkinsonianas e, em seguida, nas
categorias conhecidas de parkinsonismo.
6.1
- Condições não parkinsonianas
6.1.1
- Tremor essencial
Distúrbio
monossintomático. É diferenciado do tremor parkinsoniano por ser mais rápido,
pela tendência em se acentuar com os movimentos voluntários e por desaparecer
com o repouso.
6.1.2
- Tremor senil
Corresponde
ao tremor essencial agravado com a idade avançada. Pode se manifestar em
repouso, além de poder predominar na cabeça.
6.1.3
- Tremor rubral
É
um termo inadequado, pois não há evidências de que a lesão do núcleo rubro
produza qualquer distúrbio motor além do atribuído à interrupção das fibras do
brachium conjuctivum que atravessam o referido núcleo. Devido a proximidade da
lesão do núcleo rubro, criou-se a expressão "tremor rubral",
costumando estar nas projecções das fibras dentatorubrotalâmicas. Trata-se de
um tremor associado à ataxia cerebelar no qual qualquer acção resulta em
movimento rítmico, compassado, grosseiro e violento (tremor de acção).
6.1.4
- Depressão
A
depressão pode levar a pobreza de movimentos, às alterações de postura, à
diminuição dos movimentos associados automáticos e a ligeira rigidez.
6.1.5
- Artropatias
Certas
artropatias que levam a rigidez podem simular quadro parkinsoniano,
especialmente se a coluna vertebral é acometida. Como exemplo temos a
espondilite anquilosante. As mãos deformadas pela rigidez parkinsoniana pode
ser confundida com as alterações causadas por artrite reumatóide. Deve-se
analisar o conjunto das manifestações para se fazer o diagnóstico diferencial.
6.2
- Categorias de parkinsonismo
6.2.1
- Doença de Parkinson
Veja
quadro clínico e anatomopatológico acima.
6.2.2
- Parkinsonismo secundário
Pode
ser determinado por causas tais como:
·
Infecciosas:
o parkinsonismo pós-encefalítico é actualmente muito raro (encefalites virais,
como na encefalite japonesa B e na AIDS).
·
Medicamentosas:
bloqueadores de receptores dopaminérgicos (haloperidol, pimozide, flufenazina,
metoclopramida, cinarizina e flufenazina) e as depletoras de dopamina
(reserpina, tetrabenazina e alfametildopa). O MPTP, o CO, o Mn e o Hg são
apontados como factores tóxicos.
·
Vasculares:
múltiplos enfartes cerebrais, principalmente em nível dos gânglios da base, são
destacados.
·
Traumáticas:
"encefalopatia pugilística".
·
Outros:
tumores (raro) e hidrocefalia de pressão normal.
6.2.3
- Parkinsonismo heredodegenerativo
Condição
incomum. Nestes casos tem-se um padrão de herança identificado.
- Doença autossômica dominante dos corpos de
Lewy
- Doença de Huntington: Quando de início precoce, manifesta-se
mais por manifestações hipotônico-hipocinéticas (parkinsonismo) que por
hipotônico-hipercinéticas (coréia). A forma juvenil ocorre em somente 5%
dos casos e começa, quase sempre, entre os 5 e 14 anos. Além da ocorrência
familiar, dos quadros de parkinsonismo e demencial, há, também, algumas
alterações da oculomotricidade, como a paralisia do olhar conjugado para
cima e o retardo na iniciação dos movimentos sacádicos.
- Doença de Wilson (Degeneração
Hepato-Lenticular): autossômica recessiva, rara. Início quase sempre antes
dos 20 anos. São altamente significativos a fácies wilsoniana, o tremor em
adejo ("bater de asas"), a postura distônica, a
disartria/disfagia e o anel de Kayser-Fleisher. Na parte laboratorial destaca-se
a diminuição sérica da ceruloplasmina e do cobre, assim como elevação das
transaminases e excreção urinária aumentada de cobre. A biópsia hepática
demonstra cirrose com aumento do conteúdo de cobre. A TC do crânio revela
aumento dos ventrículos laterais, alargamento dos sulcos cerebrais e
cerebelares e hipodensidade nos núcleos lenticulares.
- Doença de Hallervorden-Spatz: autossômica recessiva, rara. Tem início
na infância ou na adolescência com sinais motores piramidais e
extrapiramidais. Nestes últimos, predominam as manifestações distônicas
associadas à deterioração mental. Após os 20 anos (início tardio), pode
manifestar-se por parkinsonismo. Na RNM observam-se o "sinal do olho
de tigre" (lesões simétricas dos globos pálidos caracterizadas por acentuação
do hipossinal e área de hiperssinal central em T2).
- Calcificação familiar dos gânglios da base
- Neuroacantocitose
6.2.4
- Parkinsonismo-plus
Corresponde
a um grupo de pacientes que, além das manifestações parkinsonianas, exibem,
também, anormalidades neurológicas adicionais.
·
Paralisia
supranuclear progressiva: apresenta-se
com parkinsonismo progressivo, distúrbios de oculomotricidade, fácies de
"espanto", retrocólis, apraxia da pálpebra, disartria/disfagia.
·
Atrofia de
múltiplos sistemas: requer o preenchimento de
critérios clínicos e anatomopatológicos para o diagnóstico. Clinico: sinais e
sintomas parkinsonianos, autonómicos, piramidais ou cerebelares. Anatomopatológicos:
perda celular em algumas ou em todas estas estruturas: caudado, putâmem, globo
pálido, substância negra, núcleo coeruleus, oliva inferior, núcleo pontino,
células de Purkinje, coluna intermédio-lateral e núcleo de Onuff da medula.
Compreende:
·
Degeneração
estriatonigral: parkinsonismo, estridor
laríngeo, disartria, disfagia e tendência a quedas.
·
Atrofia
olivopontocerebelar: combinação, principalmente,
de parkinsonismo, ataxia, disartria e disfagia.
·
Síndrome de
Shy-Drager: parkinsonismo com hipotensão postural e
anormalidades do ciclo do sono.
·
Degeneração
gangliônica córtico-basal: alterações
motoras (parkinsonismo nitidamente assimétrico, distonia e mioclonias), da
sensibilidade especial (astereognosia, agrafoestesia e apalestesia), apraxia,
fenômeno da mão alienígena.
OBSERVAÇÃO:
Com relação a demência, as relações entre as doenças de Parkinson,
de Alzheimer e a do corpo de Lewy difuso são
extremamente difíceis de abordar. Sabe-se que pode ocorrer demência em cerca de
20% dos pacientes com a DP, sendo este acometimento tardio. Por outro lado,
pode ocorrer parkinsonismo em 30% dos pacientes com a Doença de Alzheimer. Há,
ainda, a Doença do corpo de Lewy difuso, considerado, por alguns, como variante
da Doença de Alzheimer ou uma forma intermediária entre a DP e a Doença de
Alzheimer.
Diversas
hipóteses tem sido propostas para explicar a origem da DP. Para cada uma delas
há pontos a favor e pontos contrários, de modo que se pode pensar que a origem
da doença se deva a uma combinação de, talvez, destes factores aliados a outros
que possam vir a ser descobertos.
Actualmente
há cinco linhas de raciocínio de maior interesse no que se refere a etiologia
da DP:
·
Acção de
neurotoxinas ambientais
·
Produção de
radicais livres
·
Anormalidades
mitocondriais
·
Predisposição
genética
·
Envelhecimento
cerebral
2.1 - Ação de neurotoxinas ambientais
Tal hipótese baseia-se primariamente no achado de que a substância
1-metil-4-fenil-1-2-3-6-tetraidropiridina (MPTP, constatado em 1976 após um
"surto" de parkinsonismo em usuários de uma determinada remessa de
heroína nos EUA) destrói selectivamente
neurónios dopaminérgicos da SNc (substância negra compacta). A MPTP deve ser
oxidada a MPP+ pela enzima MAO-B (momoamina oxidase B) para ser neurotóxica. O
MPP+ é captado por terminais dopaminérgicos e após ser interiorizado inibe a
enzima NADH Co Q1 redutase, uma enzima mitocondrial que actua na cadeia
respiratória. Digno de nota o facto que drogas que bloqueiam a MAO-B, como a
selegilina, bloqueiam a toxicidade do MPTP.
O
quadro parkinssoniano induzido pelo MPTP não é idêntico a DP, tendo o paciente
menos tremor, maior comprometimento de equilíbrio e marcha e prejuízo cognitivo
mais evidente. Estudos em primatas não demonstraram de maneira definitiva que o
quadro induzido pelo MPTP induza degeneração de neurónios colinérgicos ou
aparecimentos de corpos de Lewy no córtex cerebral, tal como ocorre na DP.
Alguns
estudos tem constatado uma maior incidência de DP em populações expostas a
toxinas agro-industriais e água de poço. Entretanto, a exposição repetida e
prolongada a determinada toxina parece improvável, uma vez que a taxa de
concordância em indivíduos que vivem longos períodos próximos é bastante baixa.
2.2
- Produção de radicais livres
O
metabolismo normal da dopamina produz radicais hidroxila e peróxido de
hidrogénio, os quais na presença de depósitos de ferro no cérebro, poderiam
resultar em neurotoxidade por interferência na cadeia respiratória celular.
Apesar das evidências de que a SNc se encontra sob stress oxidativo na DP, não
se sabe se isto seria o evento primário ou secundário a algum outro mecanismo.
2.3
- Anormalidades mitocondriais
Já
se falou anteriormente do papel da NADH Co Q1 redutase na respiração celular.
Acrescenta-se a isso que a inibição desta enzima leva a produção excessiva de
radicais peróxido. Nesse caso, uma deficiência genética ou secundária na cadeia
respiratória poderia gerar produtos de oxidação e desencadear uma série de
processos que levaria a toxicidade celular.
2.4
- Predisposição genética
A
participação de factores genéticos poderia contribuir para a degeneração
celular através de vários mecanismos, entre eles: susceptibilidade
geneticamente determinada a toxinas ambientais e defeito capaz de gerar toxinas
endógenas e/ou dificultar a sua remoção.
2.5
- Envelhecimento cerebral
Estudos histológicos e neuroquímicos mostram que a
SNc é particularmente sensível ao envelhecimento em relação a outras estruturas
cerebrais. Entretanto há evidências que tornam tal mecanismo pouco provável. A
fase pré-sintomática da DP não é maior que 5 anos; a perda neuronal na SNc é de
cerca de 45% na primeira década da doença enquanto em indivíduos normais era de
apenas 4,7%. Finalmente, constatou-se por estudos anatomopatológicos que a
porção da SNc que mais sofre degeneração é a região dorsal, enquanto que na DP
a região mais afetada é a ventor-lateral, cujos neurônios projectam para o putâmem.
3 - Circuitos
motores
Fora Meynert (1871) quem primeiro sugeriu
que na DP haveria um funcionamento defeituoso dos núcleos da base. Os núcleos
da base são massas de substância cinzenta distribuídas pelo cérebro(figura 1). No caso do
distúrbio motor da DP é sugerido que a falta da estimulação dopaminérgica de
neurónios GABAérgicos do striatum (putâmem e núcleo caudado) que inibem a SNr
(substância negra reticulata) e o Gpi (globo pálido interno); e da inibição
dopaminérgica de neurónios GABAérgicos do striatum que inibem o Gpe (globo
pálido externo) levaria a um aumento do "tônus" inibitório sobre o
tálamo ventro-lateral. Assim o córtex cerebral receberia menor estímulo para
iniciar o movimento (figura 2, áreas muito inibidas em cinza escuro, áreas menos
inibidas em cinza claro).
4
- Quadro clínico
A
clínica da DP comporta sinais motores e cognitivos, entre outros. Para fins de
publicação científica é necessário que o paciente apresente, no mínimo, dois
sinais essenciais da doença. Por este lado, vê-se que o diagnóstico é muitas
vezes complicado, visto que os sinais não aparecerão necessariamente num mesmo
momento. Um paciente poderá ter, por exemplo, somente o tremor no início de sua
doença.
Deve-se
saber que não existe ainda um marcador biológico para o diagnóstico da DP. a
propedêutica complementar é usada mais frequentemente para excluir os pacientes
que não tem a DP que para afirmamos os que a têm. Deste modo, a avaliação
clínica criteriosa ainda é o fator essencial
para o correto diagnóstico.
A
DP é essencialmente uma doença crónica de carácter progressivo, sendo que os
sintomas costumam ter início insidioso e assimétrico. Um início abrupto
de sintomas faz com que devamos considerar mais um quadro de parkinsonismo de
outra espécie que não a DP. Veremos agora uma breve descrição dos quatro sinais
essenciais da DP e de características que falam a favor de outra forma de
parkinsonismo que não a DP.
.
Sintomatologia
Alguns dos sintomas preliminares da doença de
Parkinson. É importante salientar que nem todos os pacientes sofrem dos mesmos
sintomas.
Rigidez
Rigidez
aumentada nos músculos. A menos que seja facilitada temporariamente por
medicamentos de anti-Parkinson, a rigidez estará sempre presente. Entretanto,
aumenta durante o movimento. É frequentemente responsável por um rosto marcado
por um certo tipo de aparência. Em alguns pacientes, a rigidez conduz à
sensação de dor, especialmente nos braços e ombros.
A
rigidez parkinsoniana é plástica ou cérea, sendo diferente da rigidez elástica
característica de lesões do sistema piramidal. Acomete um segmento, um hemicarpo ou ambos
os lados, acometendo todos os músculos indistintamente. O deslocamento a
movimentação passiva é uniforme, podendo estar presente o sinal da roda
dentada. A rigidez compartilha com o tremor oposto de manifestações iniciais da
doença na maior parte dos casos. Uma explicação seria que estes sintomas
"positivos" seriam mais bem percebidos pelo paciente que
o fenômeno negativo (bradicinesia).
A
rigidez pode estar ausente nas fases iniciais da doença. Uma forma de
sensibiliza-la no exame neurológico seria a manobra de co-activação. Nesta o
paciente é solicitado a realizar voluntariamente, na articulação contralateral,
"em espelho", o mesmo movimento que está sendo realizado na
articulação testada com movimentação passiva. Pode aparecer uma nítida rigidez
com sinal da roda dentada na articulação testada
Tremor
O tremor é o sintoma que o público identifica mais
frequentemente com a doença de Parkinson, mas de facto, mais de 25% dos
pacientes apresentam apenas um tremor muito ligeiro ou mesmo nenhum. Quando
está presente, o tremor pode ser pior num só lado do corpo. Além de afetar os membros, envolve às vezes a cabeça, a
garganta, a cara, e os maxilares.
O
tremor parkinsoniano mais típico é observado durante o repouso, diminuindo ou
desaparecendo quando se inicia o movimento. Este tremor pode ainda se
manifestar na manutenção prolongada de uma postura. A frequência do tremor é de
cerca de 4 a 6 Hz. Na forma de DP com tremor predominante (DP benigna), este
pode ser de frequência menor.
O
tremor acomete preferencialmente os membros, podendo acometer o segmento
cefálico (neste, o mais comum é o "bater de dentes"). Na sua forma
mais conhecida acomete os dedos das mãos tendo a característica de "contar
dinheiro" ou "rolar pílulas". Formas de tremores mais complexas
podem ser encontradas, entretanto. Uma forma de sensibilizar este sinal em
pacientes que não o estejam manifestando continuamente ou claramente consiste
em fazer com que o paciente se abstraia com cálculos mentais.
Bradicinesia
A
bradicinesia significa a lentidão do movimento. Este sintoma é caracterizado
pelo atraso em iniciar os movimentos, causados pelo demora do cérebro em
transmitir as instruções necessárias às partes apropriadas do corpo. Quando as
instruções são recebidas, o corpo responde lentamente em enviá-las para fora.
Este
sinal é o que mais serve para diferenciar o parkinsonismo de outras alterações
motoras. Corresponde a uma lentidão dos movimentos, especialmente os
automáticos, havendo uma pobreza geral da movimentação.
A mímica
é pobre (hipomimia ou amimia), sendo a fácies inexpressiva ou congelada. A fala
é monótona e sem modulação (fala monocórdica), e no fim de uma frase o doente
pode repetir palavras ou sílabas (palilalia). A escrita modifica-se estando
presente a micrografia. Ainda estará presente a dissinergia oculocefálica, na
qual o doente, ao dirigir os olhos para um determinado lado, não acompanha com
a cabeça o movimento dos olhos.
Uma
forma de avaliar a bradicinesia de maneira objectiva consiste em pedir
ao paciente que faça movimentos repetidos e sucessivos, como abrir e
fechar o punho, ou tocar o dedo indicador contra o polegar ou mesmo bater o
calcanhar contra o solo. Há uma tendência de que com a repetição dos movimentos
estes se tornem mais lentos e de menor amplitude, podendo ter até períodos de
completa interrupção.
Instabilidade
postural
Este
sinal é algumas vezes colocado como fazendo parte da rigidez muscular. O
seu achado deve-se à perda de reflexos posturais. A propriocepção muscular e
articular, o sistema vestibular e a visão são algumas das fontes de alimentação
do sistema extrapiramidal no controle do tono postural.Os pacientes assumem uma
postura muito característica com a cabeça em ligeira flexão, tronco
ligeiramente inclinado para a frente, flexão moderada da perna sobre a coxa e
do antebraço sobre o braço, com exagero da pinça digital nas mãos. o tronco
flectidos ventralmente. A imagem lembra a de um esquiador. Em pacientes com
este sinal predominante costuma-se ter uma morbidade maior e uma progressão
mais rápida da doença (DP maligna).
OBSERVAÇÃO:
Outros sinais e sintomas que podem estar presentes na DP são o exagero dos
reflexos axiais da face (particularmente o orbicular das pálpebras), sialorreia (que
geralmente traduz bradicinesia), hipersecreção sebácea
(fácies empomadada), edema de membros inferiores, depressão do humor, quadro de
inquietação muscular (acatisia). O défice cognitivo é quase uma constante nos
pacientes com DP.
4.2
- Sinais de alerta para outra causa do parkinsonismo que não a
DP
Estes
sinais não invalidam o diagnóstico de DP, entretanto devem ser motivo de alerta
e reflexão:
OBSERVAÇÃO:
O tratamento com levodopa pode induzir complicações que irão modificar o padrão
de manifestação clínica do paciente. Estes efeitos não serão discutidos
neste texto.
5 - Classificação
Deve-se
definir primeiramente o que vem a ser parkinsonismo. Este define-se como uma
ampla categoria de doenças que apresentam uma síndrome clínica semelhante à DP,
com a presença de tremor de repouso, rigidez muscular plástica,
bradicinesia e instabilidade postural. Associado a estes sinais podem
ser encontrados sinais piramidais, alterações da motilidade ocular extrínseca,
sinais cerebelares, de disfunção autonómica, de neuropatia periférica e de
disfunção cognitiva. Os termos síndrome parkinsoniana e síndrome
rígido-acinética também são usados para descrever o mesmo quadro.
O
diagnóstico diferencial adequado entre estas várias enfermidades nem sempre é
possível. Hughes e colaboradores, em 1992, realizaram um estudo clínico-patológico
em que avaliaram a precisão do diagnóstico clínico da doença de Parkinson
idiopática (DP), concluindo que 20% dos pacientes que tinham o diagnóstico
clínico de DP apresentavam, na verdade, outro diagnóstico anatomopatológico.
Por outro lado, também pacientes que tinham quadro clínico de DP atípico
apresentavam exame anatomopatológico característico de DP.
6
- Diagnóstico diferencial
Deve-se
pensar, em primeiro lugar, em condições não parkinsonianas e, em seguida, nas
categorias conhecidas de parkinsonismo.
6.1
- Condições não parkinsonianas
6.1.1
- Tremor essencial
Distúrbio
monossintomático. É diferenciado do tremor parkinsoniano por ser mais rápido,
pela tendência em se acentuar com os movimentos voluntários e por desaparecer
com o repouso.
6.1.2
- Tremor senil
Corresponde
ao tremor essencial agravado com a idade avançada. Pode se manifestar em
repouso, além de poder predominar na cabeça.
6.1.3
- Tremor rubral
É
um termo inadequado, pois não há evidências de que a lesão do núcleo rubro
produza qualquer distúrbio motor além do atribuído à interrupção das fibras do
brachium conjuctivum que atravessam o referido núcleo. Devido a proximidade da
lesão do núcleo rubro, criou-se a expressão "tremor rubral",
costumando estar nas projecções das fibras dentatorubrotalâmicas. Trata-se de
um tremor associado à ataxia cerebelar no qual qualquer acção resulta em
movimento rítmico, compassado, grosseiro e violento (tremor de acção).
6.1.4
- Depressão
A
depressão pode levar a pobreza de movimentos, às alterações de postura, à
diminuição dos movimentos associados automáticos e a ligeira rigidez.
6.1.5
- Artropatias
Certas
artropatias que levam a rigidez podem simular quadro parkinsoniano,
especialmente se a coluna vertebral é acometida. Como exemplo temos a
espondilite anquilosante. As mãos deformadas pela rigidez parkinsoniana pode
ser confundida com as alterações causadas por artrite reumatóide. Deve-se
analisar o conjunto das manifestações para se fazer o diagnóstico diferencial.
6.2
- Categorias de parkinsonismo
6.2.1
- Doença de Parkinson
Veja
quadro clínico e anatomopatológico acima.
6.2.2
- Parkinsonismo secundário
Pode
ser determinado por causas tais como:
·
Infecciosas:
o parkinsonismo pós-encefalítico é actualmente muito raro (encefalites virais,
como na encefalite japonesa B e na AIDS).
·
Medicamentosas:
bloqueadores de receptores dopaminérgicos (haloperidol, pimozide, flufenazina,
metoclopramida, cinarizina e flufenazina) e as depletoras de dopamina
(reserpina, tetrabenazina e alfametildopa). O MPTP, o CO, o Mn e o Hg são
apontados como factores tóxicos.
·
Vasculares:
múltiplos enfartes cerebrais, principalmente em nível dos gânglios da base, são
destacados.
·
Traumáticas:
"encefalopatia pugilística".
·
Outros:
tumores (raro) e hidrocefalia de pressão normal.
6.2.3
- Parkinsonismo heredodegenerativo
Condição
incomum. Nestes casos tem-se um padrão de herança identificado.
6.2.4
- Parkinsonismo-plus
Corresponde
a um grupo de pacientes que, além das manifestações parkinsonianas, exibem,
também, anormalidades neurológicas adicionais.
·
Paralisia
supranuclear progressiva: apresenta-se
com parkinsonismo progressivo, distúrbios de oculomotricidade, fácies de
"espanto", retrocólis, apraxia da pálpebra, disartria/disfagia.
·
Atrofia de
múltiplos sistemas: requer o preenchimento de
critérios clínicos e anatomopatológicos para o diagnóstico. Clinico: sinais e
sintomas parkinsonianos, autonómicos, piramidais ou cerebelares. Anatomopatológicos:
perda celular em algumas ou em todas estas estruturas: caudado, putâmem, globo
pálido, substância negra, núcleo coeruleus, oliva inferior, núcleo pontino,
células de Purkinje, coluna intermédio-lateral e núcleo de Onuff da medula.
Compreende:
·
Degeneração
estriatonigral: parkinsonismo, estridor
laríngeo, disartria, disfagia e tendência a quedas.
·
Atrofia
olivopontocerebelar: combinação, principalmente,
de parkinsonismo, ataxia, disartria e disfagia.
·
Síndrome de
Shy-Drager: parkinsonismo com hipotensão postural e
anormalidades do ciclo do sono.
·
Degeneração
gangliônica córtico-basal: alterações
motoras (parkinsonismo nitidamente assimétrico, distonia e mioclonias), da
sensibilidade especial (astereognosia, agrafoestesia e apalestesia), apraxia,
fenômeno da mão alienígena.
OBSERVAÇÃO:
Com relação a demência, as relações entre as doenças de Parkinson,
de Alzheimer e a do corpo de Lewy difuso são
extremamente difíceis de abordar. Sabe-se que pode ocorrer demência em cerca de
20% dos pacientes com a DP, sendo este acometimento tardio. Por outro lado,
pode ocorrer parkinsonismo em 30% dos pacientes com a Doença de Alzheimer. Há,
ainda, a Doença do corpo de Lewy difuso, considerado, por alguns, como variante
da Doença de Alzheimer ou uma forma intermediária entre a DP e a Doença de
Alzheimer.
Tabela 1: Sinais de alerta na avaliação de parkinsonismo
A presença de algum destes sinais indica uma avaliação mais detalhada para afastar outros diagnósticos
|
Demência precoce e proeminente
|
Alucinações precoces
|
Sinais simétricos
|
Disfunção bulbar precoce
|
Disfunção precoce de marcha
|
Quedas no primeiro ano dos sintomas
|
Dependência de cadeira de rodas nos primeiros cinco anos
|
Falência autonômica precoce
|
Apneia do sono
|
Apraxia
|
Membro alienígena (movimentos involuntários no membro afetado)
|
Perda sensitiva cortical
|
Presença de outros achados ao exame neurológico como síndrome cerebelar, sinais piramidais e distonia precoce
|
Ausência de resposta à levodopa
|
EXAMES COMPLEMENTARES
Para excluir parkinsonismos secundários ou parkinsonismos atípicos, todo paciente com parkinsonismo deve ser submetido aos seguintes exames:
laboratório: hemograma, sódio, potássio, uréia, creatinina, cálcio iônico, fósforo, magnésio, VHS, PCR, sorologia para sífilis. Em casos selecionados, sorologia para HIV pode ser considerada;
neuroimagem: a tomografia computadorizada (TC) de crânio, em casos muito típicos com história de longa data, é suficiente para descartar causas estruturais. A ressonância magnética (RM), em casos com suspeita de parkinsonismo atípico, pode ser útil. Nos casos de AMS, observa-se hipersinal anelar em T2 na região dorsolateral do putâmen, além de hipersinal em forma de cruz na ponte. Nos casos de PSP, podemos observar atrofia do mesencéfalo, aumento do sinal em mesencéfalo e globo pálido, além de atrofia dos lobos frontais e temporais. Apesar dessas observações, ainda não existem medidas que se ocorram de forma sistemática, permitindo o diagnóstico somente pelo exame de imagem – a clínica do paciente deve ser sempre considerada como critério decisivo.
TRATAMENTO
O tratamento da DP é multifatorial e multidisciplinar. O mais importante é ressaltar que, como não há tratamento curativo, o ajuste medicamentoso deve ser feito somente à medida que os sintomas estiverem incomodando o paciente do ponto de vista funcional,ocupacional ou social de forma significativa. Vale destacar ainda que o biperideno, medicação antes bastante utilizada no tratamento da DP, atualmente deve ter seu uso evitado em virtude dos prováveis efeitos sobre a cognição. A presença de profissional familiarizado com as medicações e com a evolução da doença é fundamental para uma condução adequada do caso.
Medicamentoso
Selegilina
Inibidor da monoamina oxidase B com fraca atividade dopaminérgica, a selegilina foi muito utilizada por seu suposto papel como neuroprotetor, atualmente questionado por alguns pesquisadores. Pacientes em fases iniciais da doença costumam responder bem a essa medicação, cuja dose é habitualmente de 15 mg/dia.
Amantadina
Inicialmente utilizado como antiviral, essa medicação tem boa atividade dopaminérgica, além de ter a propriedade de reduzir as discinesias quando estas começam a aparecer. Costuma haver boa tolerância em doses até 300 mg/dia, apesar de poderem causar alucinações em fases mais avançadas da doença, as quais regridem com a redução da dose.
Agonistas Dopaminérgicos
A bromocriptina, antigamente muito utilizada no tratamento da DP, hoje tem seu uso reduzido pela introdução dos agonistas dopaminérgicos não-ergotamínicos, como opramipexole e o ropinirole. Estes têm atividade dopaminérgica próxima à da levodopa, porém com maior meia-vida e, conseqüentemente, estimulação regular do receptor dopaminérgico, diminuindo as flutuações motoras. Essas medicações têm ainda efeito neuroprotetor e antidepressivo fracos. De efeitos colaterais mais típicos, observamos os “ataques de sono”, além de efeitos gastrointestinais. A dose efetiva do pramipexole é de até 4 mg/dia e a do ropinirole até 24 mg/dia.
Levodopa
Principal linha de tratamento da DP, com alto índice de eficácia em sintomas como bradicinesia e tremor. Geralmente tem seu início adiado ao máximo pelas complicações motoras que aparecem com seu uso em longo prazo, sendo primeira opção de tratamento quando a DP aparece em pacientes mais idosos. Como efeitos colaterais principais, encontramos náuseas, diarréia e hipotensão postural. Deve ser sempre administrada com inibidor da enzima que degrada a levodopa perifericamente (benzerasida, carbidopa), a fim de aumentar sua biodisponibilidade no SNC. O tratamento deve ser iniciado com doses pequenas, aumentando-se progressivamente à medida que o paciente tolerar. Quanto à posologia, no início, as tomadas podem ser divididas 2 a 3 vezes ao dia, mas, com o avançar da doença, observamos a ocorrência do fenômeno de wearing off, sendo necessário ajuste do horário das tomadas. No ajuste da dose de levodopa, devemos observar ainda a presença das complicações motoras, como a presença de discinesias. Se estas ocorrem logo após a tomada da medicação, podem ser secundárias ao pico de levodopa, com boa resposta com a redução da dose; se ocorrem pouco antes da próxima dose, podemos aumentar a dose, aproximar as tomadas ou ainda adicionar um inibidor da catecol-O-metiltransferase (COMT). Outras complicações que podem alterar a posologia da levodopa são a presença de distonias, alucinações e sintomas gastrointestinais.
Inibidores da COMT
Esta classe de medicação foi introduzida recentemente no tratamento da DP por sua ação sobre a COMT, aumentando a meia-vida da levodopa no SNC, reduzindo as flutuações motoras e, conseqüentemente, as discinesias. O tolcapone, quando administrado, deve ser acompanhado de monitorização freqüente das enzimas hepáticas, sendo sua dose habitual entre 300 a 600 mg/dia. O entacapone tem uma administração mais segura, porém deve ser dado com todas as doses de levodopa do dia, sem necessidade de monitorar enzimas hepáticas, até o limite de 1.600 mg/dia.
Outros Medicamentos
Tratamentos específicos para as manifestações não motoras da DP podem ser usadas, como antidepressivos tricíclicos e inibidores da recaptação de serotonina para os quadros de depressão. Antipsicóticos atípicos, como a quetiapina, podem ser utilizados para o controle de agitação e alucinações. Anticolinesterásicos e antagonistas glutamatérgicos podem ser usados quando quadro demencial se iniciar. O tratamento de queixas disautonomicas também pode ser abordado com medidas comportamentais e medicamentosas específicas.
Reabilitação
Fisioterapia
A instabilidade postural e o freezing, sintomas extremamente incapacitantes da DP, não têm qualquer resposta significativa com o tratamento medicamentoso, encontrando na fisioterapia sua principal intervenção. Além disso, a fisioterapia ajuda da melhora da marcha e da bradicinesia, tornando o paciente mais dinâmico e evitando complicações como quedas.
Fonoaudiologia
A disartria parkinsoniana também é outro sintoma bastante debilitante da DP e mostra melhoras muito satisfatórias com o emprego de técnicas fonoaudiológicas, como a de Lee Silverman.
Terapia Ocupacional
Desenvolve habilidades motoras, com melhora da bradicinesia e melhora da auto-estima do paciente.
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